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O Papel do Agro e os Diferenciais de Biosseguridade em Granjas e Fábricas de Rações
24/09/25
Artigo do professor de gestão de qualidade em fábricas de rações na Fazu, Ednilson Fávaro. Texto publicado no LinkedIn
Muitas vezes já fui questionado sobre o motivo de ser tão difícil visitar uma fábrica no Brasil. Em outras, ouvi a indagação: “o que vocês têm a esconder nas fábricas e granjas brasileiras?”. Na última semana não foi diferente. Em uma conversa com um amigo europeu que planejava visitar algumas unidades fabris no país, percebi sua surpresa ao conhecer as barreiras restritivas aplicadas em nossas granjas e fábricas de rações.
Para ele, acostumado aos padrões de biossegurança da União Europeia, muitas das práticas brasileiras soaram “excessivas”. No entanto, ao aprofundarmos o tema, ficou claro que essas medidas não são apenas necessárias, mas estratégicas para garantir a competitividade do agro brasileiro em um cenário global cada vez mais exigente.
Apresento a seguir um resumo das principais medidas (embora não sejam as únicas) e dos controles existentes, bem como a função de cada um deles, conforme expliquei ao meu amigo de tantos anos.
A Biosseguridade como Pilar do Agro Brasileiro
O Brasil ocupa posição de liderança global na produção e exportação de proteína animal. Avicultura e suinocultura são cadeias robustas, sustentadas não apenas por tecnologia e escala produtiva, mas principalmente pela confiança internacional em nossos padrões sanitários.
Esse nível de confiança só é possível porque o país adota protocolos de biosseguridade mais rígidos do que muitos parceiros comerciais. As medidas preventivas, por vezes vistas como barreiras exageradas por visitantes estrangeiros, são a chave para manter o status sanitário privilegiado e abrir portas para mercados exigentes como União Europeia, Japão e Oriente Médio.
Granjas e fábricas de rações são os dois ambientes mais sensíveis da cadeia. As granjas concentram alta densidade animal, o que aumenta a vulnerabilidade a surtos. Já as fábricas de rações, por sua função de distribuição, representam potenciais multiplicadores de risco. Por isso, ambas operam sob sistemas integrados de controle, alinhados às diretrizes do MAPA e da ABPA.
Diretrizes da ABPA e do MAPA
A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) definem protocolos que devem ser seguidos em toda a cadeia produtiva, do transporte à produção. Entre os principais pontos, destacam-se:
- Barreiras físicas e restritivas: cercas perimetrais, sinalização clara, portarias monitoradas e zonas de quarentena para veículos e materiais.
- Controle rigoroso de acesso: registros de entrada e saída, obrigatoriedade de EPIs, pedilúvios, rodolúvios, arcos de desinfecção e controle informatizado do fluxo de pessoas.
- Fluxo controlado de pessoas e insumos: vestiários de barreira com troca completa de vestimentas e calçados; em granjas de alto risco, banho obrigatório para ingresso em áreas de produção.
- Monitoramento e vigilância sanitária: amostragens periódicas, diagnósticos laboratoriais de rotina e vigilância epidemiológica ativa, com notificação imediata de qualquer suspeita.
- Planos de contingência e biossegurança integrada: contenção em caso de suspeitas, segregação de áreas afetadas, abate sanitário quando necessário e sistemas de comunicação rápida com autoridades sanitárias.
Essas diretrizes não são opcionais: são condição essencial para a competitividade internacional. Sem elas, o Brasil não manteria acordos de exportação que sustentam grande parte de sua balança comercial.
Responsabilidades das Fábricas de Rações
Nas fábricas de rações, a biosseguridade é construída em múltiplas camadas de proteção, desde o recebimento das matérias-primas até a entrega final ao cliente. Entre as principais medidas, destacam-se:
- Controle de fornecedores: auditoria e homologação de parceiros, exigência de certificações e origem rastreada dos insumos.
- Higienização de veículos e cargas: áreas específicas para lavagem, desinfecção e monitoramento de entrada/saída, com registros eletrônicos.
- Zonas críticas com acesso restrito: armazenagem, silos, linhas de produção e expedição operam sob monitoramento contínuo.
- Controle integrado de pragas: barreiras físicas, armadilhas, inspeções periódicas e registro sistemático das ocorrências.
- Treinamento e capacitação: programas constantes em Boas Práticas de Fabricação (BPF), protocolos de biossegurança e simulações de emergência.
- Higienização e manutenção preventiva: calendários fixos de limpeza de equipamentos, filtros e dutos, com validação microbiológica.
- Rastreabilidade completa: cada lote de ração deve ser rastreado até a origem da matéria-prima e ao destino final.
Assim, a fábrica deixa de ser apenas um ponto de produção e passa a atuar como barreira sanitária para toda a cadeia produtiva.
Eficácia dos Planos de Contingência Brasileiros
O Brasil é reconhecido internacionalmente pela eficácia de seus Planos Nacionais de Contingência contra enfermidades de grande impacto. Dois exemplos se destacam:
- Influenza Aviária: O MAPA mantém vigilância contínua em aves comerciais, de subsistência e silvestres. Barreiras de controle são reforçadas em zonas de risco migratório, e ações de simulação de surtos são conduzidas regularmente. Nos episódios recentes em aves silvestres, o Brasil conseguiu conter os focos sem que atingissem a produção comercial — reforçando a confiança internacional.
- Peste Suína Africana (PSA): Erradicada do Brasil desde a década de 1980, a PSA é ameaça constante em razão de surtos em outros países. O Brasil mantém rígido controle de fronteiras, fiscalização em portos e aeroportos, campanhas educativas e monitoramento laboratorial contínuo. A rápida resposta institucional é considerada diferencial estratégico e referência em organismos internacionais.
Esses planos só funcionam graças à integração entre governo, setor produtivo e colaboradores. A biosseguridade, nesse contexto, é coletiva e sistêmica.
Conclusão
A biosseguridade no agro brasileiro é um instrumento de soberania sanitária e econômica. Sem ela, o país estaria vulnerável a crises devastadoras que comprometeriam a produção, a exportação e a própria segurança alimentar.
Granjas e fábricas de rações não atuam isoladamente: são elos de um sistema integrado de prevenção e resposta. As fábricas, em particular, assumem papel ativo ao aplicar protocolos de controle, higienização e rastreabilidade que asseguram a conformidade com padrões nacionais e internacionais.
No entanto, o ponto central está nas pessoas. Protocolos, máquinas e barreiras são inúteis sem comprometimento humano. É cada colaborador — operador, supervisor, motorista, técnico ou gerente — que dá vida à biosseguridade no dia a dia.
Assim, biosseguridade não é apenas tecnologia ou norma: é cultura. Uma cultura construída sobre disciplina, conhecimento, responsabilidade e visão de futuro.
Uma resposta ao amigo europeu
Portanto, quando meu amigo me perguntou por que tantas barreiras, controles e protocolos rígidos, respondi:
“No Brasil, não se trata de exagero, mas de compromisso. Cada barreira protege não apenas os animais, mas milhões de empregos, o abastecimento alimentar e a confiança dos mercados internacionais. Aqui, cada colaborador entende que seu papel é vital, e essa consciência coletiva é o que garante que o agro brasileiro se mantenha forte, seguro e respeitado no mundo.”
São essas atitudes que nos tornam, há anos, um dos pilares que sustentam a economia brasileira.
Perguntas como a dele me deixam feliz, pois entendo que — dos órgãos federais às iniciativas privadas, passando por associações e colaboradores — todos lutamos as mesmas batalhas diárias sem fraquejar. Atitudes como essas fazem do nosso Agro o que ele é: um gigante.
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